Thursday 26 April 2007

Das mil e uma noites - O tapete voador


Anda... vamos voar. Tonta, porque não acreditas em tapetes voadores?.. vê-me nesta raiva bruta de tanto te querer a derrubar a mesa que o prende... deixa estar a jarra... apanha-la depois... esquece as flores... estão murchas... sente apenas o tapete, que te aquece as costas. Vais sentir-me agora, dentro de ti, a aquecer-te o corpo, a incendiar-te a alma e a gerar explosões de chamas nos teus sentidos...

Vem... temos que regressar... a noite está fria já, o ar rarafeito, e mal conseguimos respirar.. regressemos á terra. Vamos sair do tapete.

Acreditas agora em tapetes voadores?

Tuesday 24 April 2007

Divagações V


Porque não correr?

De forma febril, descompassada, violenta, selvagem, imponderada, indomável, correr aos tropeções com um esgar de raiva na face transformada - metamorfose -, transtornada... eterna face de menino, de menino...

( Porque não sabes para onde vais...)

Deverei andar?

( Retroceder... já sabes o caminho, basta olhares para as marcas que deixaste no pó, nas árvores, naquelas faces de várias mulheres que te deram água.. retrocede até veres os sinais que te indicavam o caminho... não os viste, bem sei... passaste a correr que nem um louco...)

Divagações IV


Vejo passar um cego e apetece-me dar-lhe a minha visão.


Não te via desaparecer, teria bengala para me amparar e um cão como companhia...


( Mas o cego devolver-me-ia a visão... as imagens contidas nela levam á loucura..)

Monday 23 April 2007

Divagações III



Fallen... lembras-te daquelas horriveis e penosas dores de barriga que a tua literatura me provocava? Pois... voltaram em força...

Se não te importas, imprime as divagações... acabou-se-me o papel higiénico...

Ah... falta a musiquinha de fazer um menino com cara de parvo, não é?

« Pequenina, não sejas complexada

tens o tamanho ideal

para a prática

do sexo oral. »

Divagações II


« Não posso viver sem a minha alma. Não posso viver sem a minha vida..»

Lembras-te?.. naqueles tempos a terra era habitada por uma raça de gigantes que falavam a linguagem dos anjos e desprezavam os humanos. Só assim me compreendeste, alma imensa. Só assim cheguei a ti, Gigante...

Lembras-te?... Batalhaste comigo. Perdeste.
Ganhei-te pela força, levei-te comigo.
Perdi.

Devolvi-te a liberdade para alcançar a paz... vi-te ir... e ainda olhavas para trás.
Perdeste-te.

Segui as tuas pegadas, para te encontrar.
Perdi-me.

( Na encruzilhada em que estamos ninguém nos pode vislumbrar. Perdemo-nos. )

- Larga a harpa, maldita musa... isto não é uma história de amor, é uma história de gigantes. E tem um anjo.. um anjo, vil criatura...

Como posso viver sem a minha alma? Como posso viver sem a minha vida?

Vivendo.. para a recuperar. Recuperá-la, para a viver. Entregá-la para serenar. Entregar-me..

( Para enfim adormecer.. )
« Out On the wiley, windy moors
We'd roll and fall in green
You had a temper, like my jealousy
Too hot, too greedy
How could you leave me
When I needed to possess you?
I hated you, I loved you too
Bad dreams in the night
They told me I was going to lose the fight
Leave behind my wuthering, wuthering
Wuthering Heights... »

Sunday 22 April 2007

Divagações I


Ignoro o que fazes... talvez seja melhor assim. Ver-te quando queres ser vista, imaginar-te quando queres ser imaginada, sonhar contigo quando queres ser o meu pesadelo.

Sabes?... ontem choveu, aqui... alguns juram que caiu granizo, imagina... serei eu o unico a saber que foste tu que mandaste mensagens pelas nuvens?... Que as tuas mensagens de amor caiam do céu nas gotas tépidas de uma chuva tropical?... que as tuas mensagens de dor provocaram o tal granizo que me fez abrigar?

( Onde?... onde me posso eu abrigar?... só em ti, agora... obrigaste-me. Abriga-me. )
« Hello..
Do you miss me?
I hear you say you do
But not the way I'm missin' you..
What's new?
How's the weather?
Is it stormy where you are?
Cause you sound so close but it feels like you're so far
Oh would it mean anything ?
If you knew
What I'm left imagining
In my mind.. In my mind
Would you go.. Would you go
Kiss the rain?.. »

Wednesday 18 April 2007

There's going to be violence


Sentiu coragem de o voltar a abrir.. olhou, fascinado, aquele universo de teclas brancas, de teclas negras, devassadas por tantas mãos incompetentes... gastas, já.. sujas.. conspurcadas. Olhou para as suas próprias mãos. Estavam suadas. Tremiam. Olhou-as como quem olha a derradeira esperança de uma vida serena.. mas duvidava delas, assim perfiladas e estendidas, pedintes, magoadas, mas.. ansiosas... ansiosas... vertigem, espaço. Que música criariam umas mãos destroçadas? Como reagiriam teclas brancas, teclas negras, devassadas, sujas e conspurcadas ao toque nervoso das pontas de uns dedos ágeis outrora, assustados agora?...


- Play it again, Fallen.. play it again.

( You must remember this! )

Iniciou aquele estranho caleidoscópio de memórias com um lento bailado. Os dedos cruzavam-se, suavemente... tocava delicadamente nas teclas brancas - harmonia - , tocava ferozmente nas teclas negras - agonia -, os olhos assim fechados eram promessas de um espirito tranquilo.. falsas promessas essas. Viajava o espirito, para longe... tão longe... não queria ser alcançado...

- Play it again, Fallen, play it again!!

A música era estranha... amarga. E até o liquido que caía nas teclas brancas da harmonia ( pling..), nas teclas negras da agonia, embalavam-no, invocavam-no... limpou a testa com um lenço branco, não queria mais gotas de suor a fazerem pling nas teclas brancas da harmonia...

Pling...

Teria que limpar os olhos... teria que limpar os olhos...

- Don't play it again, Fallen ...
« I know it’s coming
There’s going to be violence
I’ve taken as much
As I’m willing to take
Why do you think
We should suffer in silence
When a heart is broken
There’s nothing to break » ..

Thursday 12 April 2007

Broken heart


Como hei-de eu conter a minha alma, para que não toque na tua?
Como hei-de eu erguê-la por sobre ti para outras coisas?
Como eu desejaria dar-lhe abrigo
à sombra de qualquer coisa perdida no escuro
num recanto estranho e repousado,
que não vibrasse com o teu vibrar.
Mas tudo o que nos toca, a ti e a mim,
Toma-nos juntos numa só arcada
Que arranca de duas cordas um som único.
Sobre que instrumento estamos retesados?
Que músico nos tem na sua mão?
Oh doce canção!

Rainer Maria Rilke

Abraço-te, Rainer. Abraço-te como um reconhecido que reconhece um igual. Afasto a estúpida e mentirosa ideia de tempo e espaço para te abraçar. Tal como tu, não consigo conter a minha alma.

Ele sente, pressente, que um ausente está demasiado presente.. a presença não sentida, a ausência consentida... perdida... perdida...

Vem, fantasma, assombrar-me. Só mais uma noite, imploro-te. Invoco-te. Como naquela noite em que te sentaste nos umbrais frios e húmidos da minha janela e sorriste para mim. Recordo-me de te abrir a janela, para que entrasses. E apenas entrou o frio. E apenas sorriste. Recordo-me de te colocar um cobertor sobre os ombros. O cobertor trespassou-te, caiu lá em baixo, naquela calçada irregular semelhante a um coração partido. Tu apenas sorriste. Recordo-me de tentar trazer-te até mim, violentamente, retirar-te desses umbrais agarrando-te pelos ombros, esbofetear-te enquanto te arrastava pelos cabelos até á minha cama, quente. As minhas mãos ficaram geladas de tanto planarem pela humidade de uma noite distante, também ela semelhante a um coração partido... ar, era apenas ar. E tu apenas sorriste e voltaste a sorrir..

Em tempos existiu um homem que passou uma noite junto a uma janela, hirto, em transe. Em tudo via corações partidos. Na calçada, no ar, na lua, na esquina, nas paredes.. era uma rua escura e vazia. Repleta de corações partidos.
« So long ago, I don´t remember when
That´s when they say I lost my only friend
Well they said she died easy of a broken heart disease
As I listened through the cemetery trees
I seen the sun comin´ up at the funeral at dawn
The long broken arm of human law
Now it always seemed such a waste
She always had a pretty face
So I wondered how she hung around this place »

Monday 9 April 2007

Pinta-me...


Há quanto tempo tinhas a minha vida nas tuas mãos?

Recordo-me de tentar chegar a ti, com todas as minhas forças. Tu autista, tu trapezista, não o permitias. Dançavas com a minha ilusão, aproximavas-te para ser vista, afastavas-te quando sentias um olhar cansado de tanto te olhar. Baloiçavas, criança... e eu empurrava o baloiço inconcientemente.. ou talvez gostasse de observar a elasticidade das tuas coxas, os movimentos compassados das tuas pernas... para a frente, para trás... nunca viste o meu rosto, lívido de ternura, pungente de amor... eu apenas empurrava o baloiço... não, nunca me viste chorar por ti.

Nunca viste o meu rosto. Tu já viste o meu rosto. És o meu rosto. No meu rosto vês apenas as emoções que me provocas. Toma o pincel.. pinta-o agora. Como queres o meu rosto?.. Esboça um sorriso ao esboçares o meu sorriso, ilusionista. ( É assim que me queres? A sorrir?... mas o meu sorriso é desencantado, bruxa.. cuidado com o que pintas. Por ser tela em branco posso desejar como hei-de ser preenchido. Posso? Posso... poderei?...)

Cobre a tela, apaga a luz e deixa-me descansar. Vais pensar na pintura que sou. E vais pintá-la. E vais ser fiel ao retrato que manténs ( oh, suave presunção ) na tua cabeça.

Vai ser um quadro de amor... vai ser um quadro de amor...

« Terror de te amar num sitio tão frágil como o mundo
mal de te amar neste lugar de imperfeição
onde tudo nos quebra e emudece
onde tudo nos mente e nos separa. »

Tuesday 3 April 2007

Melodia para uma rosa selvagem


« Porque era um Deus que passava embalado pela melodia da flauta que tocava »

Porque era apenas um homem, embalado pelas dúvidas, desejando as certezas. Caminhava aos tropeções ou levitava na vertigem voraz que o aniquilava.. mas sempre respondera ao apelo. E nunca fugia da vontade indómita de batalhar. Perdido já estava, só lhe restava vencê-la.

Porque era apenas uma mulher e as cicatrizes que não tinha no corpo mantinha-as na alma. Estranho castelo aquele, inexpugnável e eternamente invicto, defendido somente pela dor nostálgica de momentos perdidos e jamais esquecidos...

Porque eram apenas um homem e uma mulher consumiram-se pela carne, amaram-se pele a pele, perderam-se em olhares.. faziam alianças enquanto desfaziam temores, erguiam cúpulas de sonhos enquando derrubavam pudores e eram cúmplices em actos ignóbeis e proibidos em que adoravam deuses pagãos. Ajoelhados, cumpriam a sua homenagem com saliva, com gemidos, com palavras incompreensiveis proferidas com a respiração alterada, com unhas a entranharem-se na pele, marcando novos caminhos por desbravar, desbravando novos caminhos por trilhar, trilhando vontades eremitas de desejo, desejando.. desejando... desejando.

Porque era um Deus que passava, embalado pela melodia de uma Deusa que o tocara.