Wednesday 31 October 2007

Nasceu uma estrela ( e é a mais linda )

Já estarás agora naquela que será a tua casa rodeada de ternura e de amor. És tão frágil que apetece colocar-te numa redoma e ver-te abrir os olhos plenos de esperança e de sonhos.. mas não o podemos fazer, estrelinha.. como beijariamos nós essa tua face tão pura? Como agarrariamos nesses teus pés irrequietos, com ganas de os morder? Não... serás livre porque pertences a alguém que te protegerá sempre e que daria a vida por ti. E é a liberdade mais pura que alguma vez terás. Nasce do amor incondicional e de lágrimas de comoção minha pequena estrelinha.. tal como outrora nasceram outras estrelas.. queres saber como foi? Eu estava lá... ouve-me então, pequenina. Vou contar-te uma história até adormeceres. Tão serena.. tão calma...

Naquela escuridão primeira do principio dos tempos, os Anjos envolviam a Luz. Ouviam-se os cânticos divinos da criação e cada nota ecoava pelos confins daquilo a que hoje chamam Universo. E o eco trazia uma estranha mistura de cores que explodiam na maravilhosa barreira que era a nossa voz. A cada explosão um brilho invisivel rasgava o espaço.. e lá ficava eternamente a brilhar. A brilhar como os olhos dos teus papás quando te contemplam, minha pequenina... assim nasceram as estrelas. Eu olhei para a minha e disse-lhe muito baixinho: És a estrela mais linda de todas as estrelas.

O teu papá não precisa de olhar para o céu, estrelinha.. olha para ti, com os olhos a brilhar, e diz-te muito baixinho: És a estrela mais linda de todas as estrelas.

( Gostaste, estrelinha? Dorme agora.. tão terna, tão eterna, que confiaremos já no teu brilho. Brilharás sim, pequena Maria do Carmo. Dorme agora, estrelinha.. dorme... )

Wednesday 24 October 2007

Moinho de vento

Lembras-te do velho moinho?...

Nessa altura também eu era Quixote e via gigantes, também eu olhava o horizonte e via unicórnios a mergulhar num lago incandescente. Olhava o sol de frente e cegava somente com a escuridão... tudo em mim era flamejante.. até o velho moinho que afinal era um gigante. Tu chamavas-me á razão, tocando-me ao de leve no ombro, sorrindo, sorrindo sempre, estavas sempre presente e falavas-me assim baixinho: « É apenas um moinho ».
Mas se também sorri para ti, mas se então dei-te a mão e derrubei aquela porta, derrubando-te num abraço eterno, beijando-te com um olhar terno.. o que importa?

Lembras-te do velho moinho? Não sei quem colocou na terra tamanha ilusão...

Wednesday 3 October 2007

O demónio que dançava com fantasmas ao luar

Não foi a ave canora que me sussurrou, languidamente, naquela noite em que os fantasmas dançaram com os demónios ao luar, com o inebriante som de uma chama a crepitar, não foi a ave canora que me sussurrou o que agora vos vou contar...

E juraste silêncio, Caído... aqui não voltarás a entrar.

Esquecida na névoa que envolve - amante - o Tempo, esquecida na penumbra que acolhe - sôfrega - o velho peregrino que regressa das terras áridas fustigadas pelo teu nome, dorme agora a Dor. Invoco-a, agora.. para que jamais me falem de amor. Com o inebriante som de uma chama a crepitar, era eu o demónio que dançava com o teu fantasma ao luar. Ah.. nesse breve pas de deux sincopado não foi a ave mas um demónio alado que ousou sussurrar a dor á Dor. Poderia com pena, gravar pela pena, a pena a que foi condenado.. jamais será amado, nunca mais poderá amar. Mas ainda levita e dança com fantasmas ao luar.

E sussurraste, Caído... e Caído dançaste com a Dor ao luar...

Mas é o demónio que não ouve e nenhuma ave o vai sussurrar. É demónio que finge, é o demónio Esfinge, o homem ou a vida? É o demónio que finge viver como homem mas nenhum homem dança com fantasmas ao luar. Mas é invocado por uma chama a crepitar onde mulheres desnudas dançam loucas e o pas de deux sincopado é apenas um ser outrora alado que dança também.. com a sua Dor e com mais ninguém e levita enquanto observa a ave, moribunda e silenciosa, tentando voar para o fim do mundo onde o demónio não voltaria a entrar.