Wednesday 30 December 2009

Para que não me voltem a questionar: « O que sabes tu de poesia? » A resposta é: nada. Vivo-a. :-)

Numa certa noite em que já dormias serena
e bátegas de chuva teimavam em não te despertar
vê lá tu - que triste cena -com um olho entreaberto e outro quase a fechar
encostei-me á tua pele tão morena
e logo ali soube que valeu bem a pena o raio do temporal não te acordar.
Mas o que acorda - dirão vocês - é o trovão!
Mas o raio aqui era o raio que a partia
aquele que não faz clarão que não ata nem desata
que me provoca uma enorme tesão
e tendo que me conter, então contarei raios noutro dia
e os segundos até ao trovão. Não ata nem desata!
Faz contas á tempestade: Está longe? - talvez seja verdade -Ora que raio de malapata!
Viro-me nessa cama teimosa porque nem ela colabora... triste de mim...
quando enfim eu esfusiante pensava « já lá mora! »
quando enfim tive uma erecção, primeiro milagre, atenção!!
nem a tempestade a acordou, o raio que a iria partir murchou ...
E eu chorei até nascer o dia porque querendo apenas uma simples queca..
raios e trovões! - fiz poesia!!Para compensar a perca... Ou escreve-se perda?
E nada rima agora com perda.. Oh merda...

Para quem me pede poesia, aqui está... pois é... não tenho mesmo jeitinho nenhum para essa coisa. Perdeu-se um poeta mas ganhou-se algo que faz falta neste país: um ordinário. E venha agora a nós um pouco da legitima poesia: « Cá para mim, devo ter os gostos trocados! Detesto os bonzinhos. Adoro os malvados!! » J.C. Ary dos Santos

Poesia... talvez seja o derradeiro apelo de uma alma muda, mas que tanto tem para dizer. Que tanto tem para gritar. Talvez seja o derradeiro múrmurio de um telepata inconsciente. Certamente será mendicidade. Quem sofre escreve e oferece a sua alma ao mundo. Ao seu mundo. Aos seus mundos. E mendiga o sofrimento. É o seu alimento. É o seu Universo, assim exposto. Num verso. Numa linha torta. Numa palavra arrancada. Numa ferida aberta. Numa cicatriz consentida. Quantos versos, quantas palavras, quanta poesia numa vida... « Homem, olha as coisas com humildade! Até o barro tem poesia! » Fernando Namora

O Eugénio, Sr. Eugénio, num último escarro para a existência e sobretudo para os desistentes... e sobre tudo cuspiu nos existentes que hoje clamam para si com exigência exagerada - e descarada - a nobreza de ser poeta: «Passamos pelas coisas sem as ver, gastos, como animais envelhecidos: se alguém chama por nós não respondemos, se alguém nos pede amor não estremecemos, como frutos de sombra sem sabor, vamos caindo ao chão, apodrecidos. » Eugénio de Andrade

Eles cairam... e não deixaram frutos. Mas num pomar, com as frutas pelo chão, caídas ainda intactas... qualquer garoto corre para as apanhar. Depois atira-as. Joga futebol com elas. Atira-as a qualquer animal. Joga até se cansar. Nem repara que a fruta estava ainda intacta... deixa-a putrefacta, num qualquer terreno baldio. No focinho de animais. Espreme-a depois, para tirar das mãos o cheiro de uma esporra precoce, numa masturbação imberbe. E chega a casa a cheirar a fruta. Mas nauseabundo. « Quero ver-te nua, a rolar pelo chão. Sem palavras, sem temores. O teu corpo e o meu. Quero levar em mim o teu cheiro animal, eternamente gravado num sorriso fácil de adivinhar. E ninguém questionará ao ver o meu sorriso o estranho cheiro que exala. É cheiro a amor e a foda. E eles conheceram-no a vida toda. E sorrirão comigo. E inconscientemente contigo.. porque eu sorri e cheiro a amor. Sem pudor! » Nuno Ferreira

Sunday 27 December 2009

A batalha final. Ou finalmente um novo ano. Ou um bom ano para todos vós.

Armadura. Prateada, resplandecente. Ainda invicta. E será sempre. Dourada nos ombros, ofusca e cega. Atemoriza. Excita. Quando bato no peito gosto de ouvir aquele som... o bater com o punho, sinal de honra. O bater com a mão aberta, sinal de desespero. Espero sempre pelo ressoar metálico que me incentiva. Ou que me acalma. Eu visto-a e chamo-lhe minha. Ela protege-me e dá-me segurança. Confio nela. Ela sofre os golpes que me são destinados. Ela nunca me trairá. Amo-a.

Elmo. Negro. Estranho contraste... Esmaga-me o crânio, está bem apertado junto á face. Esmaga-me para dizer que é meu. Escuro como breu. Mais que me proteger, é uma máscara. Esconde emoções. As ternas, plenas de lágrimas. As violentas, carregadas de furor. As indefinidas num furor de lágrimas. Ele protege o meu rosto absorve para ele a solidão que me é destinada. Deste nada que me transforma transporta ele a ilusão. Carrega ele, negro e escuro como breu, com placidez e numa estranha calma a minha alma. Negra e escura como breu. Mas isso só ele sabe. E eu. Ele nunca me abandonará. Amo-o.

Espada. Dizem que foi empunhada em tempos ancestrais. Dizem que foi erguida, nas longas batalhas pela Vida, perdida para os mortais.Dizem que só eu a posso carregar. Dizem que queima a mão, num fogo lento e de chamas vermelhas, a quem mais lhe ouse tocar. Tem runas na lâmina, resplandecente. Ainda invicta e será sempre. Deste nada em que a transformo é ela a minha ilusão. Não lhe toquem... é a morte vermelha que passa. Trespassa. Fere. Alimenta-se de sangue. Tem o dom de cessar as lágrimas em rostos lividos de furor. É minha porque me pertence e a mim quer pertencer. Amo-a.

Vesti-me assim. De amor. Hoje levo para o derradeiro campo de honra tudo o que me amou nesta vida, tudo o que me protegeu. As minhas defesas e eu. Nada mais. Porque vamos combater precisamente o Amor. Essa crosta que tenho urgentemente que arrancar. Para poder ser eu novamente.. e novamente voltar a voar. Sem saber onde ir. E novamente voltar a sorrir sem saber onde ficar... caminhar. Habitar. O amor vencerá o AMOR. Armadura, elmo e espada os que me amaram e mostraram o que quero ser. Combater para partir. Partir para viver. Um bom ano para todos.

Nuno.

Friday 25 December 2009

A inclusione unius ad exclusionem alterius

Oiço rumores lá fora... parece que todos estão felizes. Hoje. Agora. Nesta hora oiço vagos rumores de felicidade. Em cada esquina oiço um sorriso. Oiço em cada escadaria de um qualquer prédio antigo, o conforto. Oiço o calor que hoje- e só hoje- aquece os mil e um corações solitários que ontem - ainda ontem- vos enchiam de náusea. Ou pior: de pena. Estranha comiseração... Eu que não tenho coração, nada vejo. Ou talvez feche os olhos. Mas gostava de ter um coração uma época por ano. Dar uma moeda e - pasmem-se - sorrir, a quem me estende a mão... A proxima época é o Carnaval. O mendigo está mascarado de pobre, o pobre de mendigo, e a moeda continuará na vossa mão. Ah, como os oiço implorar meio quilo de ilusão...

( Fallen, tens as luzes! Repara nas luzinhas a brilhar! Uma vez por ano, colocam as luzes!! E tens pais natais nos centros comerciais, Fallen!! E Fallen, o homem chegou á Lua... E Caído, já permitem casamentos gay! E, estúpido, vamos ter TGV. E sobretudo, Anjinho imberbe, as luzinhas, porra! Por essa baixa fora, por essa avenida acima... acima. Até iluminam aquele gajo que está ali ao frio... podia escolher um cobertor melhor.. aquele não condiz com a nossa felicidade. É uma manta retalhada de sonhos que devolve a verdade. Faz como eu e desvia o olhar. Que nada estrague a noite em que o menino nasceu. Reza a lenda que pobre, numa manjedoura, como o mendigo agora... ou eu. Mas há que dar ilusão nesta merda tão desfasada... e gostava de ser o mendigo outra vez... Agora muito a serio... o homem chegou á Lua?? Fico feliz... )

Há coisas que estão para além das palavras. Para além da compreensão. Para além do perdão... Como responder que não sabemos? Que nunca vimos? Quem nem imaginámos? As pessoas integras não concebem tais atrocidades... mas aplaudem o homem na lua. As luzes de Natal...

A poeira impede que me vejam bem mas estou aqui. Os vossos gritos não me permitem perceber, mas estou aqui. Porque a história da Humanidade foi escrita não com luzes, mas com lágrimas... estou aqui. Porque até os mais reles ainda choram, ainda sentem, estou aqui. Estou aqui!!!

Estou aqui para vocês. Sim, para vocês. Vocês são os heróis. Avançam para o negrume sem garantias de voltar a sair e sabem que há gente á espera na escuridão. À espera de salvação.. à espera de uma palavra... Homens comuns, mulheres comuns, tornados extraordinários por actos de compaixão. Uma só vez por ano. Uma só vez. ..Homens comuns, mulheres comuns, que se recusam a desistir...Não há palavras.. não pode haver palavras... apenas a raiva misturada com raiva, suficiente para obscurecer o sol. E o ar que respiramos carregado de perguntas... O mesmo ar que partilhamos um só dia NO ANO. Que é hoje.

Eu já vi outros mundos, outros locais... caminhei ao lado de deuses e chorei com anjos. Caminhei e chorei. E vi o vosso mundo e outros locais.

O que dizemos ás nossas crianças? Que o Pai Natal existe ou que vocês existem? Talvez digamos sinplesmente que as amamos e que as havemos de proteger, que daríamos a nossa vida por elas. Num universo de playstations talvez seja um presente sem substância, mas é o único que poderá secar as minhas lágrimas, sarar as minhas feridas.. por vocês existirem.

Hoje é Natal, parece... vão ter um dia em cheio! Fico feliz... hoje afasto-me...

Mas contem comigo nos próximos 364 dias.