Ele ainda recorda o tempo das lágrimas. E com o tempo que lhe resta recorda em lágrimas. Em tempos existiram olhares que fulminavam, mãos que acenavam, unhas que cravavam. Lágrimas criadas por sorrisos tontos e logo secadas com um sorriso alheio mas tão - tão!! - cúmplice. É tudo o que resta, recordar. Porque amanhã não haverão palavras - estão inquinadas -, não haverão sorrisos - pereceram -, sobretudo não haverão lágrimas - secaram -, e nada ficará por recordar... ele sabe que pode bem sem recordações. Já esqueceu muitas... ele não recorda recordações. Acorda emoções.
- Já não quero o ursinho que se ri quando o aperto. Prefiro um balão. Quero um balão!
- Um balão?.. E não queres o ursinho?
- Não. Quero um balão. Daqueles que voam porque estão ligados á máquina que os faz voar.
- Está bem. Compramos o balão e fica o ursinho para a próxima feira.
- Então filho?? Deixaste fugir o balão!!
- Pois deixei. Vai dizer olá ao avô.
O céu já não é o mesmo. Talvez as estrelas ainda sejam as mesmas. Mas não o céu. Nem as estrelas. Se não as vejo, não podem ser as mesmas. E não acredito que escondidas num céu sujo vadiem as minhas estrelas. Ou o meu balão.
- Se acreditares muito e bateres palmas as fadas não morrem, sabias?
Nunca deixei morrer uma fada... cansei as mãos em ritmos eloquentes até as deixar a arder. Vermelhas. Como o meu balão. E sei que é uma fada que o tem na mão e que o guarda, carinhosamente, numa redoma especial. Um dia terei a minha nave espacial e voarei vertiginosamente numa louca combustão. Baterei palmas ao destino, e a fada renascida será o menino que um dia perdeu o balão.
Saturday, 14 November 2009
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6 comments:
Lindo :-)
Há meninos que não sabem o que querem. Ora querem ursinhos ora querem balões. Ora querem ambos. Inevitavelmente acabam por perder algum. Ou tudo.
Resta-lhe a fada que nunca abandonou e lhe seca as lágrimas que nunca brotou.
E regressa à velha casa - nunca deixou - feita de falsa e ilusória magia como falsas são as palavras de poesia (porque poetas são fingidores em demasia).
Esvoaça-lhe o mundo da palma da mão e embarca na nave da fantasia para nova ficção, como estrela cadente em adulterado céu de imaginação.
E pronto já despertou o sorriso em mais uma renovada recordação.
Continuas a escrever divinamente...
Andrea, sou. :-)
Anónimo, grato por achar que escrevo divinamente. Lamento não poder retribuir o elogio. Não neste estilo. De fingidores. Aconselho-o a praticar mais, contudo. Está quase lá. Quando parar de fingir, chegou. boa SORTE.:-)
Deixei de responder a comentários imbecis apenas e só por isto: quando ainda me divertia por aqui, certo dia ocorreu a morte de alguém que eu nem sequer conhecia. Mas que me tocou profundamente, por afinal ser uma morte. Estúpida e trágica, como qualquer morte. Injusta por retirar a vida de um jovem. Alguém bem intencionado, fez um comentário, não compreendendo o texto. Eu faria o mesmo comentário. Também não o compreenderia. Reparo que alguém, anos após esse episódio acontecer,está neste momento a olhar para o umbigo. Era melhor recordar recordações ou ler. Ou acordar emoções. Mas ler.
Como a culpa foi minha, aqui fica o reparo: Este texto é dedicado ao meu avô.
Continuo a achar que escreves divinamente, não precisas retribuir o elogio porque já o fizeste muitas vezes e eu nem gosto de elogios.
Mas para que conste publico o pedido de desculpas se ofendi
E agrada-me o reparo que fez tal como na altura a autora também o fez (a única diferença é que não se ofendeu nem a ela nem a ninguem. Não compare incomparaveis)
( Comparo, porque na altura nem conhecia a autora... mas fica o registo e aceito as desculpas )
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