Sentiu coragem de o voltar a abrir.. olhou, fascinado, aquele universo de teclas brancas, de teclas negras, devassadas por tantas mãos incompetentes... gastas, já.. sujas.. conspurcadas. Olhou para as suas próprias mãos. Estavam suadas. Tremiam. Olhou-as como quem olha a derradeira esperança de uma vida serena.. mas duvidava delas, assim perfiladas e estendidas, pedintes, magoadas, mas.. ansiosas... ansiosas... vertigem, espaço. Que música criariam umas mãos destroçadas? Como reagiriam teclas brancas, teclas negras, devassadas, sujas e conspurcadas ao toque nervoso das pontas de uns dedos ágeis outrora, assustados agora?...
- Play it again, Fallen.. play it again.
( You must remember this! )
Iniciou aquele estranho caleidoscópio de memórias com um lento bailado. Os dedos cruzavam-se, suavemente... tocava delicadamente nas teclas brancas - harmonia - , tocava ferozmente nas teclas negras - agonia -, os olhos assim fechados eram promessas de um espirito tranquilo.. falsas promessas essas. Viajava o espirito, para longe... tão longe... não queria ser alcançado...
- Play it again, Fallen, play it again!!
A música era estranha... amarga. E até o liquido que caía nas teclas brancas da harmonia ( pling..), nas teclas negras da agonia, embalavam-no, invocavam-no... limpou a testa com um lenço branco, não queria mais gotas de suor a fazerem pling nas teclas brancas da harmonia...
Pling...
Teria que limpar os olhos... teria que limpar os olhos...
Pling...
Teria que limpar os olhos... teria que limpar os olhos...
- Don't play it again, Fallen ...
« I know it’s coming
There’s going to be violence
I’ve taken as much
As I’m willing to take
Why do you think
We should suffer in silence
When a heart is broken
There’s nothing to break » ..